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PEDRO LUSO DE CARVALHO
A Décima Sétima
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul julgou, em 17
de julho de 2014, o recurso de Apelação n° 70053592275,
interposto pelo autor contra a decisão do juiz de primeiro grau da
Comarca de Caxias do Sul, por ter o magistrado proferido sentença desfavorável
ao seu pedido de indenização por dano
material (cobrança de aluguéis) contra a empresa construtora, com quem havia
assinado contrato particular de promessa de compra e venda de imóvel urbano.
Acordaram
os Desembargadores, integrantes da referida câmara cível, por unanimidade, em extinguir
o processo, sem resolução do mérito, bem como em julgar prejudicado o exame do
recurso, por não se verificar o interesse de agir do autor.
Segue, na íntegra, o acórdão:
apelação cível. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS
MATERIAIS. COBRANÇA DE ALUGUÉIS ANTE ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL. CARÊNCIA DE
AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL.
Não se verifica
presente o interesse de agir do autor, vez que antes do ajuizamento da ação as
partes repactuaram novo prazo para entrega do bem. Somente na eventualidade de
vir a ser descumprido esse novo prazo caberá pretensão de indenização de
valores gastos com aluguel.
PROCESSO EXTINTO, DE
OFÍCIO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. PREJUDICADO O EXAME DO RECURSO.
Apelação Cível
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Décima Sétima Câmara Cível
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Nº 70053592275 (N° CNJ:
0083854-28.2013.8.21.7000)
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Comarca de Caxias do Sul
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JORGE EDEGAR MONTEIRO
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APELANTE
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TERRA E CASA CONSTRUTORA E INCORPORADORA
LTDA
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APELADO
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ACÓRDÃO
Vistos,
relatados e discutidos os autos.
Acordam
os Desembargadores integrantes da Décima Sétima Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Estado, à unanimidade, em, de ofício, extinguir o processo, sem
resolução do mérito, e em julgar prejudicado o exame do recurso.
Custas
na forma da lei.
Participaram
do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.ª Liége
Puricelli Pires e Des. Giovanni Conti.
Porto
Alegre, 17 de julho de 2014.
DES. LUIZ RENATO ALVES DA SILVA,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Luiz Renato Alves da Silva (RELATOR)
Trata-se
de ação indenizatória por danos materiais (cobrança de aluguéis) ajuizada por
Jorge Edegar Monteiro em desfavor de Terra e Casa Construtora e Incorporadora
Ltda.
Reporto-me
ao relatório da sentença (fls. 68-68v):
JORGE EDEGAR MONTEIRO ingressou
com ação de indenização por dano material (cobrança de aluguéis) contra TERRA E CASA CONSTRUTORA E INCORPORADORA
LTDA, expondo, em síntese, que, em 27-10-2008, por meio de contrato
particular de promessa de compra e venda de imóvel urbano, efetuou a compra de
uma unidade residencial, número 09, constituída por uma residência de
alvenaria, com dois pavimentos, com área privativa de 59,94m², a ser construída
sob os terrenos de matrícula n.7.535 e 5.769. Foi acordado o preço de
R$88.600,00, sendo que efetuou o pagamento de R$52.000,00, quando da assinatura
do acordo, conforme cláusula 2.1-A e A. Também foi estabelecido que o prazo de
entrega da unidade residencial a ser construída seria de 09 meses a partir da
assinatura de financiamento na Caixa Econômica Federal, para quitação do saldo
devedor. Ocorre que tendo obtido verba para adimplir seu saldo devedor, e
passados mais de 16 meses do prazo estabelecido para entrega da obra, o autor
em 24-5-2010, efetuou notificação extrajudicial e após propôs ação de rescisão
contratual cumulada com danos materiais (010/1.11.0007867-3) a qual tramita na
4ª Vara Cível desta Comarca, onde foi pactuado a suspensão do processo até dia
30-11-2012, data limite para que a demandada entregue o imóvel. Destaca que o
referido contrato estipula na cláusula 3.1.2 o pagamento de aluguel por atraso
na entrega da obra, valor que deve ser definido pela média de três avaliações a
serem elaboradas, cuja obrigação perpetuará até a entrega do imóvel. Salienta
que o atraso na entrega do imóvel acarreta inúmeros prejuízos, seja pelo atraso
no retorno do investimento que a entrega tardia acarreta, seja pela
impossibilidade de o autor instalar-se com sua família no imóvel adquirido,
fazendo perdurar seu gasto com locação residencial. Entende que a ré incidiu em
mora contratual a partir de 24-01-2011, data em que expirou o prazo pactuado,
de nove meses, após a notificação extrajudicial efetuada. Pede a condenação da
demandada nas penalidades contratuais em decorrência do inadimplemento do
pacto, desde a data prevista para conclusão da obra até a data de sua efetiva
entrega, tendo por base os orçamentos juntados, no valor mensal de R$535,00;
inversão do ônus da prova, além dos ônus sucumbenciais. Juntou documentos
(fls.07-59).
Pediu e obteve
concessão do benefício da AJG.
Citada, a demandada
deixou fluir “in albis” o prazo para contestar (fl.67v).
O
dispositivo foi exarado nos seguintes termos (fl. 69):
Isso posto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO,
atribuindo ao autor o pagamento das custas processuais, com suspensão de
exigibilidade da sucumbência, na forma do art. 12 da Lei 1060/50, por estar
litigando sob o abrigo da gratuidade da justiça.
Registre-se.
Intimem-se.
Contra
o decisum irresignou-se o autor, mediante apelação (fls. 71-76)
dispensada de preparo. Resgata que a decisão equivocou-se ao considerar
suspensão do processo de rescisão contratual conexo com a presente demanda.
Afirma que a suspensão tão somente impede o prosseguimento da ação e rescisão
do dito contrato, não se excluindo pelo acordo firmado, o direito de aplicação
de cláusula de multa contratual pelo atraso na entrega da obra como inicialmente
contratado. Pondera que a repactuação de prazo para entrega da obra não implica
ou acarreta o abono ou inexistência da atraso de fato. Alega que deve ser
observado que ante atraso injustificado deve incidir multa em razão de perdas e
danos conforme artigo 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor. Discorre que a
indenização é devida pela impossibilidade de utilização do imóvel. Garante ser
incontroverso que há atraso na obra, ressaltando ter sido decretada a revelia.
Destaca ser certa a obrigação assumida pela apelada contratualmente pertinente
ao pagamento de aluguel ao apelante, equivalente ao valor de mercado da unidade
objeto do contrato, em caso de não ser entregue o imóvel no prazo
convencionado. Colaciona jurisprudência sobre reparação por danos materiais
ante descumprimento de prazo de entrega de imóvel. Requer o provimento do apelo
para julgar totalmente procedente o pedido e condenar a empresa ré ao pagamento
de aluguéis mensais no valor de R$ 535,00, a título de indenização.
À
fl. 77 é recebido o recurso no duplo efeito.
Sem
contrarrazões.
Os
autos vieram a este Tribunal, sendo conclusos após declinação da competência
(fls. 79-79v).
Registro,
por fim, que foi observado o previsto nos artigos 549, 551 e 552 do CPC, nos
moldes da adoção do sistema informatizado.
É
o relatório.
VOTOS
Des. Luiz Renato Alves da Silva (RELATOR)
Adianto
que o presente processo deve ser extinto sem resolução do mérito.
No
caso em tela, o autor, Jorge Edegar Monteiro, ajuizou a presente ação
indenizatória por danos materiais visando obter condenação da empresa ré, Terra
e Casa Construtora e Incorporadora Ltda., ao pagamento de aluguéis, ante o
atraso da entrega do imóvel que adquiriu da requerida.
Não
tendo sido apresentada contestação, restou decretada a revelia da demandada.
Por
oportuno, destaco que os efeitos da revelia não são automáticos e absolutos, de
forma que o juiz pode deixar de aplicá-los quando o conjunto probatório
determinar que os fatos não justifiquem a condenação, de acordo com seu livre
convencimento motivado.
Nesse
sentido há precedentes desta Corte:
APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO.
RESPONSABILIDADE CIVIL. REVELIA. SERVIÇO DE TELEFONIA. DANOS MORAIS E
MATERIAIS. BLOQUEIO POR DÍVIDA COBRADA INDEVIDAMENTE. 1. Revelia configurada.
A carta AR de citação foi juntada em 21.05.2007 (verso da folha 21), tendo a
demandada contestado o feito intempestivamente em 20.06.2007 (verso da folha
24). Não obstante, a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor
(artigo 319, CPC) é relativa, não influenciando o direito aplicável à
espécie, de modo que é lícito ao magistrado examinar e julgar conforme a prova
dos autos. Contexto em que não se dispensa a parte demandante do ônus de
provar os fatos constitutivos de seu direito (art. 333, I, do CPC). (...) RECURSOS
DAS PARTES DESPROVIDOS. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70023365968, Nona Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Léo Romi Pilau Júnior, Julgado em
26/03/2008) Grifei.
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO.
AÇÃO DE COBRANÇA. CHEQUE. REVELIA. EFEITOS RELATIVOS. SOLIDARIEDADE. NÃO
CONFIGURADA. Os efeitos da revelia previstos no art. 319 do Código de
Processo Civil revestem-se tão-somente de força relativa, a qual pode restar
mitigada ou afastada pelo convencimento do juiz derivado da realidade
evidenciada nos autos, o que de fato ocorreu no presente. (...) Negado
provimento ao recurso. (Apelação Cível Nº 70021786660, Décima Segunda Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cláudio Baldino Maciel, Julgado em
08/11/2007) Grifei.
Enfim,
o julgador de acordo com seu livre convencimento motivado, não resta obrigado à
aplicar a presunção de veracidade, contida no art. 319 do Código de Processo
Civil, quando o conjunto probatório não justifica a condenação.
Logo,
ainda que considerada implementada a revelia essa não é suficiente para acolher
integralmente o pedido.
De
fato, compulsando os autos tenho que não prospera a pretensão do recorrente.
Ocorre
que conforme termo de audiência apresentado à fl. 56, observa-se que as partes
litigantes nesse feito, concordaram com suspensão de outro feito ajuizado (ação
de rescisão do contrato), posto que a empresa ré se comprometeu a entregar o
imóvel em nova data, in casu 30/11/2012. Assim, repactuada nova data
para entrega do bem, entendo não ser caso de aplicar multa.
Nesse
mesmo sentido é a decisão recorrida da lavra da ilustre Juíza de Direito, Dra.
Zenaide Pozenato Menegat, cuja fundamentação agrego às presentes razões de
decidir a (fls. 68v-69):
Diante da inércia
da ré, decreto-lhe a revelia, com os efeitos do art. 319 do CPC, presumindo-se
verdadeiros os fatos articulados na inicial, quanto ao atraso na entrega da
obra contratada.
A revelia, contudo,
não implica, necessariamente, o acolhimento da pretensão deduzida na inicial,
cabendo ao julgador verificar se dos fatos fictamente comprovados, decorre ou
não a consequência jurídica pretendida pelo autor.
O contrato foi
firmado em 27-10-2008, ficando estabelecido que a obra seria entregue no prazo
de nove meses, a partir da assinatura de financiamento do saldo devedor na
Caixa Econômica Federal, com uma tolerância de 150 (cento e cinquenta) dias,
contados da data da contratação.
Somado o prazo de
entrega (nove meses) com o de tolerância contratual (150 dias – equivalente a
cinco meses), tem-se que a obra deveria ser entregue no prazo de 14 (quatorze)
meses, desde que não ocorrido qualquer dos fatos ressalvados na cláusula 3.1.1,
justificativos de atraso para imissão do promitente comprador na posse da
unidade residencial adquirida.
Contudo, em outro
feito, as partes resolveram suspender o processo até a data de 30-11-2012, que
é a data limite em que a ré se comprometeu a entregar o imóvel (fl.56).
Com a suspensão do
processo, que implica prorrogação amigável do prazo para entrega da obra, tem-se
por suspensa também a cláusula de incidência da multa ora questionada, que
seria exigível pelo descumprimento do novo prazo acordado.
Ocorre que o prazo
de suspensão ainda não transcorreu integralmente, o que significa dizer que
falece ao autor o direito de cobrar aluguel, por pretenso atraso na entrega da
obra, sabendo-se que novo prazo foi estipulado, o qual encontra-se em fluência.
Tem-se, assim, que
os efeitos da cláusula 3.1.2 do contrato particular de promessa de compra e
venda de imóvel urbano, que determina a obrigação da promitente vendedora de
pagar, ao promitente comprador, uma multa mensal equivalente ao aluguel da
unidade residencial contratada (cláusula 3.1.2) foram igualmente suspensos, por
força do novo prazo convencionado para entrega da obra.
Como corolário,
inobstante a revelia, tem-se que dos fatos fictamente comprovados – atraso na
entrega da obra – não decorre o direito de o autor receber locativos mensais
pretéritos, a título de multa, tendo em vista que as partes convencionaram novo
prazo de entrega da obra, prazo esse ainda em fluência, o que afasta, neste
momento, a alegada inadimplência.
Ocorre que são
incompatíveis entre si o ato de concessão de maior prazo para entrega da obra
com a pretensão de cobrança de multa por atraso pretérito.
Por outro lado, considerando que restou
repactuada nova data para entrega do bem em momento anterior ao ajuizamento da
ação, e observando que a sentença foi proferida antes da nova data combinada
para entrega tenho que não se verifica presente o interesse de agir do autor.
Somente
na eventualidade de vir a ser descumprido esse novo prazo caberá pretensão de
indenização de valores gastos com aluguel.
Isso
posto, de ofício, por se tratar de questão de ordem pública, extingo o processo
sem resolução do mérito, com fundamento no art. 267, VI, do Código de Processo
Civil, e mantenho a condenação do autor ao pagamento dos ônus sucumbenciais,
suspensa a exigibilidade em face da concessão de assistência judiciária
gratuita.
Outrossim, julgo prejudicado o apelo.
Des.ª Liége Puricelli Pires (REVISORA) - De acordo com o (a) Relator (a).
Des. Giovanni Conti - De acordo com o(a) Relator(a).
- Presidente - Apelação Cível nº 70053592275,
Comarca de Caxias do Sul: "DE OFÍCIO,
EXTINGUIRAM O PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, E JULGARAM PREJUDICADO O EXAME
DO APELO. UNÂNIME."
Julgador(a)
de 1º Grau: ZENAIDE POZENATO MENEGAT
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